A proposta de mediação de Luis Alberto Warat denota grande influência de Gaston Bachelard, que nos incitava a “desaprender quase tudo”.[1] Ela pode ser considerada destrutiva e desconstrutivista, como o mesmo afirma, um modo de desaprender o que nos é imposto, abrindo-se um espaço vazio para a criatividade, recuperando-se a autenticidade e espontaneidade, indispensáveis à mediação. A desconstrução como estratégia para os procedimentos de mediação, já que o mediador precisa ajudar as pessoas a se descontruírem, vendo também suas próprias sombras, aliando-se a um processo de construção do pensamento, dos sentimentos, da sensibilidade, utilizando a colagem, a mímica, os jogos e as dramatizações (p. 188). A proposta de seu livro é de proporcionar uma viagem à própria vitalidade do leitor, ao amor, ser um estímulo para que este descubra o que sempre esteve oculto em si mesmo. Possui nítida influência do zen budismo, como se denota da primeira citação antes mesmo do início da introdução, de Osho, e seu conceito de meditação, como sendo o conhecimento do ser, quando o ser sabe, integra e integralmente, que é.[2]
Tal proposta em muito se assemelha, pois, no nosso entender, à proposta da meditação, visando alcançar a paz interior, o silêncio, a não violência, um cuidar de si e do outro, uma proposta de valorização dos sentimentos, da criatividade, da outricidade, da alteridade, da busca de vazios, do amor, da poesia, de um saber com sabor, um saber que oriente a participação, um saber orientado para a alteridade. Uma epistemologia de vida, um saber em movimento, é a epistemologia que quer desordenar o saber e não destruí-lo (p. 268). Neste sentido o mediador é equiparado pelo próprio autor com o mestre, com um mestre zen, podendo apenas ajudar, orientar, servir de guia, para que as pessoas se encontrem como mestres de si mesmos, encontrando a sabedoria dentro de si mesmo e suas próprias verdades.
Assim, a proposta waratiana de mediação se distanciaria de outros métodos alternativos de resolução de conflitos, como a conciliação e arbitragem, em tudo diversos, diversidade esta que se inicia já com a própria consideração acerca do conflito, não sendo esta a preocupação central da mediação proposta por Warat, donde distanciar-se de tais formas de dominação e de simulacros.
Outrossim, a proposta de mediação waratiana em muitos aspectos se assemelha à proposta por nós desenvolvida na obra teoria poética do direito,[3] e também na teoria erótica do direito,[4] sendo esta uma continuação daquela outra, o que não poderia ser diferente, quando a obra de Warat se mostra como um dos fundamentos e fonte de inspiração de tais desenvolvimentos teóricos, que buscam a revalorização e a reaproximação dos saberes poéticos, poiéticos, criativos, criadores, transgressionais, questionadores do status quo, dos saberes enlatados e domesticados, evocando o questionamento persistente diante de todo ponto de vista (p. 137). Contrária, portanto à proposta da ciência que nos afasta de nosso autêntico ser ao nos impedir de duvidar, indagar, de correr riscos, e com isso acabando por incrementar os próprios riscos.
É o direito visto poieticamente, sempre em construção, nunca já pronto e acabado, portanto, posto, positivo, como se costuma entendê-lo. É o direito visto de forma erótica, vital, e não estagnado como a concepção positivista e formalista do direito que atualmente impera. Tais propostas colocam como essencial ao direito e ao conhecimento em geral a transdisciplinariedade, ao invés da univocidade do discurso jurídico homogêneo, fechado em si mesmo e em dogmas sem fim. Por uma nova forma de conhecimento, e produção do Direito, não preocupado com sua pureza, mas sim, confundindo estilos, transitando por vários deles, introduzindo a metáfora e a poesia abertamente como modo de pensar o direito (p. 189).
Ambas as propostas se voltam ao cuidado de si e do outro, à alteridade, à outricidade, como fundamentos esquecidos do direito, e que precisam ser resgatados, a fim de preencher o vazio do Direito, atualmente preenchido por pura violência, dominação, poder, ideologias, força. Ambas reconhecem o valor do erotismo, do amor, e sua relação com o direito, com o humano, e a necessidade da transdisciplinariedade ao direito, por um saber aberto, permitindo-nos abrir para o novo, e que ajude ao homem a buscar sua autonomia, que se daria com a alteridade, autonomia ao se tornar mestre de si mesmo, e então estará mediado, harmonizado; trata-se de uma cidadania surrealista, preocupada com o diálogo e a outricidade, com um entre-nós, uma cidadania holística e mais humana, ancorada em um direito mais humanizado.
Trata-se de uma nova proposta de mediação como forma de resgate dessa promessa, do amor, do cuidado com os mínimos detalhes de si e do outro, uma epistemologia libertária. É uma forma de alquimia, de transformação interior, de si mesmo, equiparando-se em alguns pontos o mediador ao xamã, que faz o resgate da alma perdida. O conceito de cidadania surrealista vincula-se novamente com a magia, ante a sua potencialidade ritual de decantação e transformação alquímica do mundo. Tal cidadania exercita a ética da inoportunidade (ético-poética) do cidadão-poeta, demolidor de tudo e de si próprio, reconhecendo-se que o melhor vínculo entre os homens é o poético. A cidadania surrealista é um grande diálogo; é a poesia como espaço vital o entre-nós que constitui a outricidade (p. 230).
A melhor forma de se transmitir o saber seria a forma poética, utilizada com destaque na antiguidade, e também tal linguagem poética, a linguagem dos afetos, seria a linguagem necessária à mediação, segundo Warat, já que para este mediação é um processo do coração, aproximando-se da holística (p. 69), uma concepção da mediação como direito da alteridade, um direito vital, uma justiça vital, uma forma de humanização das relações humanas (p. 74), enquanto realização da autonomia e dos vínculos com o outro, possibilitando uma melhoria da qualidade de vida. Desta forma voltaremos a ser um sujeito de direitos com direitos, ser cidadão no sentido de poder opinar e decidir por si mesmo. O futuro da cidadania e dos direitos humanos estaria na mediação como cultura e com práticas para sua realização na experiência cotidiana das pessoas.
Trata-se de um saber com sabor, contrário aos saberes estereotipados, imobilizadores e estéreis, ou seja, precisamos desaprender o aprendido.
A mediação como um processo que recupera a sensibilidade, como um estado de amor, de amor tântrico (p. 38). Meditação como uma forma de cultura, de vida, introduzindo o amor como condição de vida (p. 41). Como uma proposta cultural, um novo paradigma cultural e jurídico que propõe nos inscrever na trama de uma educação da sensibilidade e da ternura, uma proposta pedagógica transformadora da sensibilidade, individual e coletiva. Uma ética cidadã de ternura a partir da mediação, reconhecendo no afetivo sua dimensão fundamental.
Aponta Warat, outrossim, diversos problemas na maior parte das escolas de mediação, as quais na verdade, formam conciliadores, negociadores e não mediadores (p. 41), esquecendo-se de que a mediação não é uma ciência, mas uma arte que tem que ser experimentada; as escolas de mediação estão preocupadas em produzir respostas prontas, planejadas, preocupadas em dominar. Um mestre está preocupado com comunhão, encontro de corações sem palavras; o mestre forma mediadores mostrando-lhes o valor de ser simples, sem ego; para formar um mediador é preciso levá-lo a um estado de mediação, deve ser mediado, ser a mediação, estar mediado, é entender o valor de não resistir, de deixar de estar permanentemente em luta (p. 47). Em continuação, enfatiza a existência de alguns impasses no procedimento de mediação quanto à efetividade (p. 79 - 80), em especial aponta para a falta de preparo do mediador, pois carrega ainda a postura armada e defensiva como de um advogado, havendo também problemas na estrutura do procedimento de mediação, que desconsidera o conflito interior e individual de cada parte.
Para Warat, mediação é conceituada como um procedimento de intervenção em um conflito de qualquer natureza, sobre todo tipo de conflito, portanto, a mediação pode se ocupar de qualquer tipo de conflito: comunitário, ecológico, empresarial, familiar, penal, direitos humanos, etc. não é descartável pensar a mediação dentro dos conflitos do saber (p. 87).
É um processo assistido, não adversarial, de administração de conflitos; como uma semiótica da outricidade que tenta interpretar o sentido do conflito a partir do lugar do outro. É uma forma alternativa de intervenção nos conflitos. É um direito da outricidade, uma concepção ecológica do Direito, uma nova visão da cidadania, dos direitos humanos e da democracia; um procedimento não adversário de resolução de conflitos que poderá apresentar momentos de negociação, de conciliação e de arbitragem (p. 90).
A mediação se revela com uma terapia do reencontro mediado, do amor mediado (TRM ou TAM), como uma forma de terapia, não um procedimento psicoanalítico, passando pela leitura da linguagem corporal e pelo afloramento da sensibilidade. É um processo de aprendizagem com o outro. Considera, assim, o universo conflituoso a partir de uma perspectiva psicológica, sensível, generosa, educativa e comunitária, visando a transformação dos vínculos conflitivos em vínculos amorosos. O amor é a melhor forma de administração do conflito. Como teoria contradogmática propõe uma nova corrente mediadora, mediante alternativa ou terapia do reencontro – procedimento de interpretação psicossomática da revisitação dos conflitos.
O amor é então retratado como uma forma de ajudar a encontrar os caminhos do crescimento pessoal, da autonomia e a experiência amorosa é vista como cura terapêutica (p. 131).
O ser humano sendo complexo precisa de um modo de pensamento que não reduza a existência, um pensamento do complexo, físico, bio-antropológico, a partir de uma perspectiva lógico-filosófica-literária que permita uma práxis ética, o qual poderá ser alcançado com o modo surrealista de entender a complexidade; pensamento do complexo e surrealismo enquanto expressão do poético como complexidade; uma epistemologia da complexidade.
Propõe um surrealismo à moda brasileira e à moda latino-americana, com uma maior influência afro e do realismo mágico (alteridade da poética, o poético como outricidade); a busca poética de si mesmo e do encontro poético com o outro. Uma desintelectualização poética, reconstruindo-se a realidade poeticamente (p. 228).
A mediação tem seu destino atrelado a necessidade da realização da autonomia, e o amor poderá auxiliar em tal autonomia.
Aponta ainda para alguns pontos de distinção entre a mediação proposta e arbitragem e a conciliação: a distinção entre tais propostas de resolução alternativa de conflito se dá pelo caráter transformador dos sentimentos; ao contrário do que ocorre com a mediação, o árbitro e o juiz julgam baseados na VERDADE FORMAL, ou seja, a conciliação e a transação não trabalham o conflito, mas o ignoram. A mediação, ao contrário, busca a resolução pelas próprias partes.
A mediação não tem como objetivo prioritário a realização do acordo, mas a produção da diferença, instalando o novo na temporalidade; não fundamenta-se na ideologia e individualismo possessivo. A mediação mostra o conflito como uma confrontação positiva, revitalizadora.
A função da mediação é a de ser um discurso amoroso destinado a inscrever as pulsões no registro de eros; o mediador ocupa um lugar de amor, não de poder, diferente, portanto, do juiz e do árbitro; o dever do mediador é da ordem da abstinência, tendo como função recolocar o conflito no terreno das pulsões da vida. O intuito de satisfação vital substitui a aplicação coercitiva e terceirizada de uma sanção legal.
A mediação é vista então como a melhor forma para superar o imaginário do normativismo jurídico, pela realização do feminino no Direito (p. 87). A mediação é proposta como um novo paradigma jurídico cultural, em busca de uma teoria jurídica da outricidade – proposta existencial pedagógica da cidadania e dos direitos humanos da outricidade.
Em termos de cidadania, direitos humanos, democracia, a mediação é sua melhor forma de realização. As práticas sociais de mediação são um instrumento do exercício de cidadania – educam e capacitam as pessoas a se autodeterminarem. Para tanto é necessária uma ressignificação da cidadania para que a vejamos como lugar, a outricidade como lugar (p. 163).
Tal proposta de mediação possui incidências que são ecologicamente exitosas como a estratégia educativa, a realização política da cidadania, direitos humanos e democracia – produz um devir de subjetividade que indica uma possibilidade de fuga da alienação.
Mediação como um critério epistêmico de sentido. Seria um salto qualitativo para superar a condição jurídica da modernidade, baseada no litígio e apoiada em um objetivo idealizado e fictício da descoberta de uma verdade que é imaginária.
O mediador é visto então como uma espécie de terapeuta que deve administrar o conflito fora da culpa, projetando responsabilidade no exterior, na cultura, nas instituições, equiparando de certa forma a mediação a psicoterapia (p. 134).
Tal terapia é afetada pelo multiculturalismo, que visa trabalhar a partir do pressuposto das diferenças culturais e dos modelos e mundos aos quais pertencemos, sendo, pois, o multiculturalismo um pressuposto fundamental para as terapias do amor mediado (p. 139).
Assim, denota-se o reconhecimento do amor, da poesia e da loucura como pontes exclusivas para a comunicação com o outro, realizando-se a sabedoria que se realiza através do amor e da poesia (p. 278).
Sua necessidade parece tanto maior em tempos como o que vivemos, de crescente isolamento das pessoas, encapsuladas no mundo virtual da telemática, televisão, telefonia e todas as tecnologias da distância (tele), que nos afastam de um maior contato direto e pessoal, dificultando cada vez mais sua ocorrência.
Note-se, de pronto, que tal empreendimento haverá de mobilizar e agenciar elementos provenientes das ciências humanas em geral, da filosofia em suas diversas modalidades e disciplinas, bem como das ciências naturais, posto que nossos atos são encenados por um corpo, que é, a um só tempo, social e natural. Além desses saberes por assim dizer “reflexivos”, produzidos conscientemente com a finalidade de ampliar nossos conhecimentos, há uma contribuição fundamental a ser prestada por saberes, digamos, “espontâneos”, gerados para atender uma finalidade antes social (ou individual) que teorética, como é o caso do Direito, das Artes e das Religiões, esta última em sentido o mais amplo possível, para incluir também formas anímicas, mágicas, mitológicas etc. Na mediação aqui proposta, não é só ela que se beneficia desses saberes todos, mas eles também seriam beneficiados por ela, na medida em que encontram ali uma espécie de “campo de prova”, um espaço em que são testados, concretamente, na vida das pessoas, em situações reais, saindo assim da abstração em que costumam ser produzidos e, inclusive, justificando-se socialmente – podendo mesmo, por que não, “entrar no mercado”, tornar-se uma profissão, um meio de vida voltado para a vida mesma, ou seja, um espaço de trocas simbólicas onde circula o símbolo por excelência de nossa sociedade, que é o dinheiro.
Do que se trata aqui, então, é de propor uma mediação que se constrói a partir de enfoque mais que propriamente científico, seja de natureza médica, psicológica ou psicanalítica, devendo este enfoque, certamente, se beneficiar das descobertas e investigações feitas nesses outros campos, circunvizinhos, assim como naqueles da filosofia, especialmente da ontologia e da ética, e também das ciências sociais, pois haverá de se constituir a partir de uma análise da situação atual do ser humano em uma sociedade como aquela em que vivemos hoje, de escala planetária, que denominamos ocidental, mas que em um sentido civilizatório - como referiu em texto célebre sobre a crise de nossa civilização já há quase um século o filósofo Edmund Husserl, principal responsável pelo desenvolvimento do método fenomenológico em filosofia -, isto é, diverso daquele meramente geográfico, deixou de sê-lo, uma vez que está no mundo todo – e apesar disso, há peculiaridades nacionais e regionais que não se pode deixar de levar em conta.
Nesta mediação que estamos vislumbrando os mediadores deverão estar prontos para tratar dos que sofrem com a falta de sentido em suas vidas. E é desse sofrimento que penso haverá de ser tratada numa mediação cidadã, assim como daquela grandeza, que não é fácil suportar, precisando ser colocada, como se diz, “em seu devido lugar”, para evitarmos tanto a “mania de grandeza”, quanto um sentimento de impotência em quem se percebe capaz de grandes realizações, mas termina realizando muito pouco, ao que lhe parece...
Os problemas tratados na mediação são problemas existenciais de um ser que não suporta bem uma existência, que sabe finita, limitada temporalmente, embora por tempo indefinido – o que Elias Canetti sugere em sua peça “Os Numerados” ser a fonte de todo o sofrimento humano, donde na sociedade “ideal” ali descrita as pessoas serem nomeadas pelo número de anos que viverão, isto é, serem “numeradas”, e isso por um sacerdote, que atribui esse número/nome quando do nascimento e vela para que no prazo nele assinalado efetivamente ocorra a morte, já sabida e, logo, esperada, sem sobressaltos e preocupações para a vida. Na “vida real”, o mais comum é que este ser que nós somos procure consolo para essa precariedade de sua vida imaginando uma outra vida, que lhe é garantida por um outro Ser, infinito, onipotente, onisciente etc. etc., ou seja, dotado de características que são o oposto positivo daquelas que ele/nós próprios possuem/possuímos, embora esse oposto positivo decorra da negação do que somos: finitos, impotentes ou “só potentes”, in(s)cientes ou “só cientes” etc. etc. Daí que haver esse “grande Outro” de nós mesmos termina ajudando muito pouco a nos consolar, quando não traz um sofrimento ainda maior do que o daqueles que não O concebem, com justificativas, no mínimo, insuficientes.
Entretanto, conforme já enunciado, a mediação aqui concebida há de se defrontar com a falta ou insuficiência de vínculos afetivos, uma perda da capacidade de imaginação, de ilusão, de sonhar quando acordado, projetar(-se), amar... Do amor, então, é do que se tratará, ainda que o seu polo invertido, o ódio, é o que em geral irá se apresentar, devendo o mediador estar preparado para auscultar, no que as vontades e interesses em conflitos manifestam os desejos que se encontram latentes. Daí que um saber do desejo, tal como se propõe a ser a psicanálise, que se oferece como resposta ao desejo de saber e amar, é sem dúvida um dos mais valiosos insumos da mediação, sendo este o ponto de vista de Warat. Fundamental, portanto, é uma aproximação à psicanálise.
Ocorre que o intento de Freud, de fundar em bases científicas a psicanálise, teria esbarrado em obstáculos epistemológicos intransponíveis, os quais, no entanto, ele vai tentar superar, por meio daquilo que o próprio Freud denominará sua “metapsicologia” – a ela, em estudo célebre de 1937, sobre o fim da análise, se referirá como a “feitiçaria” que usou, para atravessar aqueles obstáculos. Já em seu estudo “Uma neurose diabólica do século XVII”, de 1923, Freud demonstrará seu respeito pelo enfoque demonológico da loucura, superior ao da ciência oficial de então, assim como na segunda série de palestras introdutórias à psicanálise, de 1933 - que, como é sabido, jamais vieram a ser pronunciadas, devido à saúde de seu autor -, naquela que teria sido a 30ª palestra (a segunda da nova série), ele fará em relação às práticas ocultistas, especialmente a telepatia, considerando possível que o futuro avanço da ciência a revelasse plausível, enquanto, por hipótese, um resquício de quando nossos antepassados se entenderam sem possuírem a linguagem para se comunicarem. Ao que parece, portanto, Freud teria chegado a conclusão semelhante àquela de Lévi-Strauss, quando o antropólogo afirmou não poder diferenciar o estudo dos mitos feito por ele desses mitos mesmos...
Certa feita disse Jacques Lacan, em um de seus Seminários,[5] "o que vem lá do começo tem um nome: é o mito". Myeîn, em grego antigo, significava iniciar. No mito, mascara-se a verdade. Mas ela está lá, só que mascarada, enfeitada. Talvez isso seja preciso por não ser tão bela e agradável olhar para ela; por não suportarmos vê-la diretamente, sem anteparos, assim como não suportamos olhar de frente, por muito tempo, o sol - ou a morte. Como Nietzsche, que em sua obra “O Nascimento da Tragédia no Espírito da Música” (1872) atribui à extrema sensibilidade do grego antigo para a dolorosa verdade da existência que pode se acabar violenta e abruptamente sua capacidade a criação das Tragédias, podemos ver aí a fonte de sua rica mitologia, bem como, posteriormente, da transformação de ambas em filosofia, mãe de toda ciência.
Então, no mito, a verdade é dita, mas não toda a verdade: uma verdade pela metade, isto é, em símbolos. O mito é da ordem do simbólico. Aqui, vale observar que não há uma só explicação para a origem etimológica da palavra "símbolo" - como, aliás, ocorre com frequência, em etimologia -, mas pensamos que aí, mesmo quando fantasiosa uma explicação dada, ela não perde seu valor como expressão do imaginário - e a explicação real, do real, de qualquer forma, é impossível de ser dada, pois ele se define - em Lacan -, precisamente, como o que nos escapa. Para nós, nesse contexto, mito é uma fantasia estruturante do sujeito, uma verdade, que, como toda verdade, "tem uma estrutura de ficção".[6]
A compreensão desta natureza ficcional da verdade e, logo, do saber faz vir à tona, juntamente com ela, também uma compreensão do poder, como faz magistralmente ao logo de sua obra Michel Foucault, que os vincula ao próprio modo como se produz o sujeito humano, uma concepção positiva, como aquela que se encontra em Nietzsche, a qual se contrapõe àquelas corriqueiras, negativas, por associadas aos diferentes modos como se subordina esse sujeito à vontade de outro(s), enquanto força motivadora básica, na natureza e na sociedade - criativa, em última instância. "O homem não busca o prazer nem evita o desagradável: afirmando isto estou contradizendo um conhecido estereótipo.
Prazer e dor são mera sequela, o que o homem quer, o que cada parte mínima de um organismo quer, é um maior poder".[7] Observe-se que todo organismo vivo é apontado como adotado da Vontade de Potência, donde se pode explicar através desse conceito não só a sociedade, como também a natureza e, logo, o Cosmos em sua totalidade. Isso evidencia-se em outra passagem, quando Nietzsche procura mostrar a falsidade da afirmação de que as pessoas buscam acima de tudo a felicidade, partindo do princípio de que tais afirmações deveriam ser válidas também com relação ao gênero de seres ao qual pertence a espécie humana, i. e., para plantas e animais também. Para o filósofo é óbvio que esses últimos não vivem a buscar felicidade, algo "humano, demasiado humano", mas sim uma outra coisa, anterior, cuja busca pode mesmo vir a trazer infelicidade, que é o Poder. "Por o que disputam as árvores de uma floresta? Por felicidade?", pergunta, respondendo - "Por Poder!..."[8] Em seguida, acrescenta que para ele a diferença entre a raça humana em relação àquelas "pré-humanas" não está na maior felicidade atingida por aquela, mas sim no maior quantum de Poder que alcançou, ao dominar as forças naturais.
Também, sobre a Vontade de Potência tal como a concebia Nietzsche, veja-se a obra editada postumamente pelo amigo do filósofo, o músico Peter Gast (pseudônimo de Heinrich Köselitz),[9] onde a Vontade de Potência é apresentada inicialmente como conhecimento (Erkenntnis), na primeira parte, em seguida, na natureza, na sociedade e no indivíduo, para na quarta e última parte, aparecer como manifestação artística, isto é, como força. Assim sendo, para ele, poder não é sinônimo de dominação, mas significa criação. E é de uma tal concepção que necessitamos, para desenvolver waratiana e poeticamente a mediação, como um laboratório em que se investiga e espera encontrar soluções poéticas para problemas que se apresentam como jurídicos, mas são, fundamentalmente, humanos, demasiado humanos, super-humanos.
Por uma falta de explicações básicas, tornamo-nos ansiosos, infelizes e, porque não dizer, desumanos. É preciso restituir ao homem contemporâneo esta forma de saber e de se relacionar, consigo, com os outros, com o mundo, indicando-lhe saídas da crise ética em que se encontra, que ameaça sua existência e a do próprio planeta, pela escalada dos conflitos daí decorrentes.
A ética, ou seja, o saber o que devemos fazer, depende fundamentalmente da resposta àquela outra questão, que é teológica, ou melhor, religiosa, sobre o que podemos esperar do desfecho da vida. A essas duas questões, como é sabido, Kant acrescenta uma outra – o que podemos saber -, considerando as três as questões maiores que desafiam o ser humano. A ética seria a disciplina que nos conduz à felicidade, ao indicar o Bem supremo, e em razão da grande divergência entre filósofos e pessoas em geral sobre o que seria esse Bem supremo, o pensamento moderno, especialmente com Kant, vai se caracterizar pela adoção de uma ética formal, independente dos bens que desejam as pessoas e do modo como os distribuem no direito, na política, na economia etc. Aqui os princípios orientadores da ação derivam de um imperativo categórico que requer obediência universal, caso queiramos instituir a autonomia da vontade e uma comunidade de homens livres. O caráter abstrato dessa concepção termina revelando-a inadequada para motivar ações e decisões concretas, em face da diversidade e singularidade de situações com as quais nos defrontamos. A palavra ethos em grego antigo, quando escrita com épsilon (έ), corresponderia ao latim mores, significando um conjunto de normas concernentes à conduta política e socialmente regrada por normas costumeiras. Já quando escrita com êta (ή) remetia ao caráter, à natureza espontânea das pessoas, significando, literalmente, sua morada ou lar, onde nos sentimos à vontade, por corresponder ao que nos é próprio. O termo “moral”, proveniente da tradução de Cícero do latim (de mores), costuma ser utilizado indistintamente como sinônimo do termo de origem grega “ética”, sendo comumente considerado que ambos possuem o mesmo significado, enquanto alguns autores os diferenciam, atribuindo um sentido mais amplo e coletivo ao segundo, e mais restrito e individual ao primeiro. De certa maneira, resolve-se a divergência com a distinção clássica, devida a Hegel, entre Moralität, subjetiva, e Sittlichkeit, objetiva.
Também pode-se diferenciar “ética” e “moral” considerando esta última objeto de estudo da primeira, que seria um saber, saber sobre o que é devido, cabendo à moral determinar o que é devido, tornando-se, assim, objeto de estudo da ética. Como essa “ciência do dever” assume um caráter igualmente normativo, a filosofia analítica contemporânea vai referir-se a uma “metaética”, formada por proposições meramente descritivas, que toma a ética ou “as éticas” como objeto de um estudo em que o conhecimento efetivamente possa se dar, desvinculado de compromisso com o aspecto prescritivo, apesar de estar lidando com a esfera do dever ser. A ética, considerada desde a perspectiva clássica – e que ainda hoje aponta para uma de suas dimensões fundamentais - seria a disciplina que nos conduz à felicidade, ao indicar o Bem supremo, e em razão da grande divergência entre filósofos e pessoas em geral sobre o que seria esse Bem supremo, o pensamento moderno, especialmente com Kant, vai se caracterizar pela adoção de uma ética formal, independente dos bens que desejam as pessoas e do modo como os distribuem no direito, na política, na economia etc. Já na perspectiva clássica, greco-romana e, mesmo, naquela teológica medieval, a ética é sempre uma ética material, associada a outros aspectos da vida, em sua dimensão social, especialmente àqueles de natureza política, donde a indissociabilidade entre o comportamento recomendado a cada um individualmente e o que de cada um se espera enquanto membro da comunidade política: o comportamento ético seria igualmente justo e, como hoje se diz, “politicamente correto”, ou, em linguagem popular, por conhecer cada um o seu lugar. Na modernidade, com Kant, os princípios orientadores da ação derivam de um imperativo categórico pelo qual optamos de “livre e espontânea vontade”, e por isso requer obediência universal, para assim instituir a autonomia da vontade e uma comunidade de homens livres. O caráter abstrato dessa concepção termina revelando-a inadequada para motivar ações e decisões concretas, em face da diversidade e singularidade de situações com as quais nos defrontamos atualmente. É assim que hoje nos defrontamos com uma ética dita “pós-convencional”, que recupera elementos da antiga ética material, fazendo convergir, por exemplo, a ética e a política em uma teoria da justiça, como em Rawls, onde se propugna mais um procedimento para se atingir soluções eticamente justificáveis para os problemas, do que princípios com base nos quais se possa deduzir tais soluções, ou ainda regras pré-estabelecidas em que já se oferecem tais respostas. Essa é a ideia que anima, igualmente, a chamada “ética do discurso”, associada a nomes como Karl-Otto Apel e Jürgen Habermas.
No entanto, não podemos nos enganar sobre o que efetivamente podemos aprender com o pensamento ético-filosófico e outros correlatos, como o político, o jurídico, o artístico e o religioso. Também precisamos ter muito claro para nós mesmos que nosso objetivo é recuperar – ou adquirir – uma sabedoria perdida, um saber viver bem, o qual, ao mesmo tempo, implica - e decorre de - uma ética, a nos indicar o que fazer, uma arte ou estética, a nos indica como fazer, e uma religião, teologia ou filosofia, a nos indicar porque fazê-lo, cada momento sendo perpassado pelo espírito científico dos tempos em que vivemos.
Uma observação, ainda, que nos parece primordial, quase banal, e no entanto ainda necessária, sobre a filosofia, em confronto com a ciência, é a seguinte: a filosofia erra. E tanto mais quanto com ela se pretende acertar, ter razão, atingir ou – pior ainda – possuir a verdade; e tanto mais quanto com ela se queira escapar da errância para chegar a algum estado ou estância no ser, pois o ser (se) é (o) é sendo – outra observação primordial, quase banal. Precisamos errar em filosofia para acertar na vida, que é sempre errante, incerta – por que fazer da filosofia mais um artifício para ocultar isso, e tudo o mais que se termina ocultando, pretendendo fornecer, com a filosofia, soluções para o insolúvel, o mistério da vida e do universo? Que seja para sempre e cada vez mais esse mistério, que a filosofia, como as religiões, a arte e mesmo a ciência, com suas descobertas e revelações, contribuam para aumentar esse mistério, aumentar o prazer de vivê-lo. O que fazer ao fazer filosofia verdadeiramente, (mito)po-eticamente? Conseguir não fazer nada – e achar bom. Por estarmos vivo, consciente disso, com sensações, boas e más, sempre passageiras: quando boas – infelizmente – e também quando más – felizmente. Nossa errância, hoje, é tamanha, que só a podemos louvar, por esse seu tamanho desmesurado.
Pensamos que melhor do que ninguém poderá ajudar-nos a expressar o que pretendemos o teatrólogo e escritor francês Antonin Artaud, em passagem que consta logo da “introdução” de sua obra “O Teatro e o seu duplo”:
“Se é fato que grassa entre em nós, hoje em dia, a confusão, distingo perfeitamente na raiz desta confusão uma ruptura entre as coisas e as palavras, entre as coisas e as idéias e os signos que representam.
E a causa de tudo isto não é decerto carência de sistemas filosóficos, pelo contrário, o fato de serem inúmeros e contraditórios caracteriza a nossa velha cultura francesa e européia. Todavia em que é que estes sistemas afetaram jamais a vida, a nossa vida? Não pretendo afirmar que os sistemas filosóficos devam ser postos em prática direta e imediatamente, mas das alternativas que passo a expor uma terá de ser verdadeira:
Ou estes sistemas estão dentro de nós e impregnam o nosso ser a ponto de servirem de manutenção à própria vida (e se é este o caso, de que servem os livros?), ou então não penetram em nós e não têm, por conseqüência, possibilidade de prover à subsistência da vida (que importa, neste caso, a sua desaparição?)”.
Adiante, Artaud lembra-nos ainda do “número sem precedentes de crimes cuja perversa gratuidade se explica apenas pela nossa impotência de possuir integralmente a vida”.
É isso o que ocorre, quando ao invés de nos “apossarmos” da vida que já temos procuramos possuir uma verdade que nunca teremos, nem sequer devemos pretender ter...
Aliás, assim como a arte não pode ficar restrita aos museus e suas molduras, também a filosofia não está apenas nos livros de filosofia, mas tanto pode estar em um filme de faroeste ou num gibi, como dizia aqueles que hoje aclamam com um dos maiores filósofos, Wittgenstein, assim como pode estar tanto em um samba como em livros ou práticas de psicanálise, direito, literatura, religiões e até das ciências – malgré de soi-même, apesar de si mesmas.
Por que há antes o Ser e não o Nada? Perguntou-se Leibniz e dedicou-se a responder toda uma vida (e uma obra) Heidegger, concluindo, fundamentalmente, que o que há, seja lá o que for, não é nada, mesmo sendo (o) nada - que logo, a seu modo, também é...
Uma paráfrase nos ajudará a inverter a pergunta e mostrar sua falta de sentido: Por que há antes o sentido e não o sem-sentido? Claro, se o sentido – ou, pelo menos, com certeza, a pergunta por ele - é algo que o ser humano introduz no universo, como nem sempre o ser humano esteve presente nele nem nada garante que nele estará para sempre – se nem o universo, talvez, seja para sempre – então houve antes o sem-sentido, assim como antes do ser, o nada - e, na verdade, assim como foi antes, também o é agora e sempre: não há o ser nem o sentido senão na fantasia humana.
Então, para que, por que ou por o quê escrever isso ou qualquer coisa? Por mim, pelos meus, por você(s) que sentimos, que vivemos e pensamos, sem saber porque, mas queremos viver sentindo e pensando sobre isso: só (?!) por isso. É pouco? E o que é muito? Na verdade, já há muito escrito e pensado, demasiado.[10] Que tal “desescrevermos” e “despensarmos” um pouco de tudo isso que aí já está escrito e pensado, sem que nos seja de muito valia? Ou então simplificarmos o que se expressa em tratados desnecessariamente extensos, reduzirmos o que muitos chamam pomposamente de “uma filosofia” a uma “historinha”, quase um conto de fadas,[11] que podemos contar a nossas crianças e a qualquer um, para aumentar-lhes a compreensão da vida, diminuindo, assim, os conflitos ou, por uma mediação waratiana, dirimi-los, ao permitir que cheguem a uma tal compreensão, com resultado do conflito em que se envolveram.
Sofremos nessa vida e, em grande parte por isso mesmo, também fazemos outros sofrerem, quando poderíamos muito bem usufruí-la, sofrer menos, pois ela será tanto melhor se não lhe adicionarmos o sofrimento extra de buscar um modo de ser, de obediência rígida a regras universal e eternamente válidas, que pressupõe um estado de ser que nunca alcançaremos em vida, mas apenas, possivelmente, após a morte.[12]
A vida, a vida nós a queremos infinita, e ela o é, mas não como queremos, pois a queremos infinita para nós. Bem, ela não o é, mas deveria realmente ser? Ela então não perderia o valor que tem, justamente por ser rara, precária, com um começo e um fim - se fosse infinita, não teria fim, mas também não teria começo. Além disso, ela é indefinida, apesar de finita – ou, de um ponto de vista lógico, a rigor, “finível”. E mesmo assim, finita, pois enquanto a temos, ela não tem fim – então, para que a termos para sempre? A cada momento só teremos o que nos concede o momento: como agora.
Autores
Paola Cantarini
Doutora em Filosofia do Direito pela Universidade de Salento – Lecce, Itália. Doutora em Filosofia do Direito pelo Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito da PUC/SP, com bolsa CAPESe doutorado sanduiche na Universidade do Minho – Braga, Portugal. Mestre em Direito Comercial pelo Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito da PUC-SP. Pós-graduação em direito constitucional, direitos humanos e direito empresarial. Doutoranda em Antropologia pelo Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais da PUC/SP. Advogada e professora universitária.
Willis Santiago Guerra Filho
Professor Titular do Centro de Ciências Jurídicas e Políticas da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Professor Permanente no Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Professor em nível de Graduação e Mestrado da Escola Paulista de Direito (EPD). Doutor em Ciência do Direito pela Universidade de Bielefeld (Alemanha). Doutor e Pós-Doutor em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Livre Docente em Filosofia do Direito e Especialista em Filosofia e Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Advogado.
Apêndices
[1] Luis Alberto Warat, O ofício do mediador, Florianópolis: Habitus, 2001. No texto, as páginas referidas sem qualquer outra indicação são sempre desta obra.
[2] A propósito, cf. Osho, A Essência da Meditação, vv. vols., trad. Gilson César Cardoso de Sousa, São Paulo: Cultrix, 2015.
[3] Willis Santiago Guerra Filho; Paola Cantarini, Teoria Poética do Direito, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015.
[4] Paola Cantarini, Teoria Erótica do Direito, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017.
[5] Jacques Lacan, O Seminário, Livro 17 – “O Avesso da Psicanálise”, trad. Ari Roitman, Rio de Janeiro: Zahar, 1992, p. 102.
[6] Id., O Seminário, Livro 7 – “A Ética da Psicanálise”, trad. Antonio Quinet, 2a. ed., Rio de Janeiro: Zahar, 1991, p. 22. Como diziam os juristas-teólogos medievais, “fictio figura veritatis”. Cf. Ernst H. Kantorowicz, Os Dois Corpos do Rei. Um Estudo sobre Teologia Política Medieval, trad. Cid Knipel Moreira, S. Paulo: Cia. Das Letras,1998, p. 185 ss., passim.
[7] O trecho citado provém dos fragmentos póstumos, escritos nos anos oitenta, sendo a seguinte sua forma original: "Der Mensch sucht nicht die Lust und vermeidet nicht die Unlust: man versteht, welchen berühmten Vorurteile ich hiermit wiedersprache. Lust und Unlust sind blosse Frage, blosse Begleiterscheinung - was der Mensch will, was jedes kleinste Teil eines lebenden Organismus will, das ist ein Plus von Macht". Friedrich Nietzsche, “Aus dem Nachlass der Achtziegerjahren”, in: Karl Schlechta (ed.), Werke in Drei Bände, vol. III, München: Carl Hanser, 1966, p. 712.
[8] Idem, ibidem, p. 675.
[9] Nietzsche, Der Wille zur Macht. Versucht einer Umwertung aller Werte, especialmente o Livro III, "Prinzip einer neuen Wertsetzung", Stuttgart: Alfred Kröner, 1964.
[10] Aqui vale recordar a observação de Foucault, de que os chamados “mestres da suspeita”, Marx, Freud e Nietzsche, “não multiplicaram de modo algum os símbolos no mundo ocidental. (...) Eles na realidade transformaram a natureza do signo, e modificaram a feição com a qual o signo em geral poderia ser interpretado”. Cf. “Nietzsche, Freud, Marx”, in: Nietzsche – Cahiers de Royaumont, Paris: Minuit, 1967, p. 186.
[11] E aqui temos em mente a referência de W. Benjamin a Kafka, como alguém que “escrevia contos de fadas (ou fábulas – Märchen) para dialéticos”, onde se pode perceber, no interesse que o literato checo despertou, antes mesmo de sua consagração, no grande crítico literário e filósofo alemão, a postulação fundamental deste último, quanto à permanência, recalcada, em tempos de predomínio da razão tecnológica, daquela forma de narrativa fundamental e fundante, do humano, que é o mito. Cf. Walter Benjamin, “Franz Kafka. Zur zehnten Wiederkehr seines Todestages”, in: Id., Gesammelte Schriften, vol. II – Aufsätze, Essays, Vorträge -, tomo 2, Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1991, p. 415.
[12] Daí, em L´éthique. Essai sur la conscience du Mal, Paris: Hatier, 1993 p. 33, ter A. Badiou afirmado que a ética é niilista, por se basear na convicção de que “a única coisa que pode verdadeiramente acontecer ao homem é a morte”, o que a remete à inefabilidade do que é totalmente diverso, denominação ética de Deus, instância decisória da morte, onde se gera o mal: ética, “nome último do religioso como tal” (ib., p. 23).
Referências
ARTAUD, Antonin. O Teatro e o seu duplo, 2ª. ed., trad. Fiama Hasse Pais BRANDÃO, Lisboa: Fenda, 1989.
BADIOU, Alain. L´éthique. Essai sur la conscience du Mal, Paris: Hatier, 1993.
BENJAMIN, Walter. “Franz Kafka. Zur zehnten Wiederkehr seines Todestages”, in: Id., Gesammelte Schriften, vol. II – Aufsätze, Essays, Vorträge -, tomo 2, Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1991.
CANTARINI, Paola. Teoria Erótica do Direito, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017.
FOUCAULT, Michel. “Nietzsche, Freud, Marx”, in: Nietzsche – Cahiers de Royaumont, Paris: Minuit, 1967.
GUERRA FILHO, Willis Santiago; CANTARINI, Paola. Teoria Poética do Direito, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015.
KANTOROWICZ, Ernst H. Os Dois Corpos do Rei. Um Estudo sobre Teologia Política Medieval”, trad. Cid Knipel MOREIRA, S. Paulo: Cia. Das Letras, 1998.
LACAN, Jacques. O Seminário, Livro 7 – “A Ética da Psicanálise”, trad. A. QUINET, 2a. ed., Rio de Janeiro: Zahar, 1991.
________ . O Seminário, Livro 17 – “O Avesso da Psicanálise”, trad. Ari ROITMAN, Rio de Janeiro: Zahar, 1992.
NIETZSCHE, Friedrich. Der Wille zur Macht. Versucht einer Umwertung aller Werte, Stuttgart: Alfred Kröner, 1964.
________ . “Aus dem Nachlass der Achtziegerjahren”, in: Karl SCHLECHTA (ed.), Werke in Drei Bände, vol. III, München: Carl Hanser, 1966.
OSHO, A Essência da Meditação, vv. vols., trad. Gilson César Cardoso de SOUSA, São Paulo: Cultrix, 2015.
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